O Livro de Judite
O
livro de Judite tem por cenário as conquistas de um rei assírio, dito
Nabucodonosor, cujo General Holofernes ia avançando pela Ásia anterior (1, 1-3,
10). Os judeus, porém, dispuseram-se a resistir (4,1-15). Ao saber disso, o
pagão Aquior, aliado de Holofernes, aconselhou-o a não atacar os israelitas, pois
muitas vezes o Deus de Israel defendera o seu povo (5,1-24). Holofernes, porém,
tendo entregue Aquior aos judeus para que perecesse com eles (6,1-21),
empreendeu o cerco da cidade israelita de Betúlia (7,1-18). Os habitantes dessa
cidade estavam prestes a render-se, quando a viúva Judite resolveu intervir,
prometendo lutar por seu povo (8,1-36). Depois de ter orado fervorosamente
(9,1-14), revestiu-se de seus mais preciosos ornamentos, e entrou no
acampamento inimigo, encantando todos os guardas com a sua formosura (10,
1-17). Holofernes, ao vê-la, pediu que residisse perto de sua tenda
(10,18-12,9). Quatro dias depois, o General assírio, vencido pela paixão, deu
um banquete para o qual convidou Judite (12,10-20). A alta noite, Holofernes
estava embriagado a dormir, e Judite a sós com ele, na mesma tenda. Então rezou
e, com a espada do próprio Holofernes, cortou a cabeça do General; logo a
seguir regressou para Betúlia (13,1-10), onde foi recebida com grande alegria
(13,11-20). Ao ver os fatos, Aquior converteu-se à religião judaica. No dia
seguinte, os israelitas simularam um ataque e puseram os assírios em fuga (14,
11-15,7). Por fim , o povo de Betúlia canta a glória de Judite e esta louva a
Deus em ação de graças (15, 8-16,25).
Como o
livro de Tobias, o livro de Judite encerra elementos históricos revestidos de
traços teológicos, que põem em relevo o aspecto edificante da história.
Com efeito, mais de uma vez em
sua história, o povo de Israel esteve sob ameaça de poderosos reis pagãos, que
se apresentavam como senhores absolutos (4,1 s; 6,2); assim como o rei
Assurbanipal (669-630? a.C.), da Assíria cuja campanha é mencionada em 2 Cr
33,11; assim também Senaqueribe (704-681), da Assíria, conforme 2 R 18,13-37.
Igualmente terrível foi a opressão exercida pelos reis selêucidas, da Síria,
contra Israel, entre 200-142 a.C, conforme 1 e 2 Mc. De todas as campanhas, a
que parece fazer eco o livro de Judite, é a de Artaxerxes III Ocos (350-338
a.C), da Pérsia, ocorrida em 351 a.C.
A finalidade do autor sagrado era
avivar a fé do povo de Israel, que é capaz de libertar das calamidades o seu
povo, contanto que esse se mostre fiel aos preceitos da Aliança. Verifica-se
assim que os meios que salvam Betúlia do poder inimigo são espirituais: uma
viúva fraca, munida das forças que o jejum e a oração lhe conferem (8, 1-9, 14;
13, 1-10). O rei Nabucodonosor entra em cena porque é o tipo dos perseguidores
de Israel, é o adversário de Deus por excelência, “o grande rei, o Senhor de
toda a terra” (Jd 2,5). A vitória de Israel sobre este adversário, síntese de
todos os inimigos de Deus, é um prenúncio da vitória final do bem sobre o mal
(16, 2-21). O universalismo ou a proposta de salvação para todos os povos
aparece na conversão de Aquior, que, vendo a generosa façanha do Senhor por
meio de Judite, se converte à verdadeira fé (5, 5-21; 14, 5-10).
É digno de nota que a heroína do
livro é uma viúva. A viuvez como estado de consagração a Deus foi sendo
estimada por Israel nas proximidades da era cristã (tenhamos em vista a viúva
Ana de Lc 2, 36-38). A Igreja vê em Judite, a mulher fortalecida pela graça de
Deus, uma figura de Maria. Verdade é que Judite usa de ambigüidade e falsidade
para com Holofernes: isto não é censurável na guerra; Holofernes é que merece
ser censurado por haver cedido às paixões e não ter desconfiado da armadilha
que uma mulher do acampamento inimigo poderia estar preparando contra ele: o
texto, aliás, enfatiza que Judite só realizou seu papel depois de ter jejuado e
orado (9, 2-14; 12, 5-9; 13, 4-7).
O autor deve ter sido um judeu da
Palestina, a nós desconhecido, que escreveu na época dos Macabeus (fins do
século II a.C); os judeus, tendo então que lutar por suas tradições religiosas
e nacionais, seriam reconfortados pela evocação do episódio de Judite.
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