quarta-feira, 18 de maio de 2016

Revelação e Escrituras: A Revelação Divina



Um fato central e ao mesmo tempo um dos mistérios funcamentias da religião cristã é que se nos apresenta como tendo origem e fundamento numa revelação histórica. Se Deus não fosse mistério, não haveria necessidade de revelação alguma. O termo “revelação” significa literalmente “tirar o véu que oculta alguma coisa”; em fotografia – “revelar” uns rolos -, em jornalismo – “revelar” algo numa notícia - , etc. são aplicações hoje vigentes deste termo.

No aspecto religiosoquer dizer a manifestação que Deus faz aos homens sobre o seu próprio ser e de outrs verdades necessárias ou convenientes para a salvação. Dito de outra maneira, a revelação divina é um falar de Deus aos homens (locutio Dei ad homines); quer dizer, deus sai ao encontro do homem e dá-se a conhecer de duas maneiras: uma natural e outra sobrenatural.

A primeira realiza-se através das criaturas; o homem, mediante a sua inteligência, pode conhecer Deus com certeza a partir das suas criaturas, como se reconhece um artista através da sua obra. Este é o nosso conhecimento natural de Deus.

A segunda vem diretamente de Deus: é outro conhecimento que o homem não pode alcançar pelas suas próprias forças e, por isso, denomina-lo sobrenatural1. Por uma decisão completamente livre, Deus revela o seu mistério ao homem, quer dizer, o seu plano de salvação para todos os homens, e realiza esse plano enviando o seu Filho amado e o Espírito Santo.

Por quê Deus se revelou? Porque quis e porque nos ama. Com que finalidade? Para se dar a conhecer de modo gratuito e nos convidar a uma íntima comunhão com Ele, através de uma relação de amizade. O Deus invisível (cfr. Col. 1,15; Tim 1,17), na riqueza do seu amor fala aos homens como amigos (cfr. Ex 33,11; Jo. 15,1415) e convive com eles (crf. Bar. 3,38), para os convidar e admitir à comunhão com Ele2.

A revelação é inaugurada aqui no tempo pela fé – resposta humana a essa interpretação divina -, mas é destinada a chegar à sua plenitude na vida para além dos tempos, no encontro cara a cara homem com Deus. Em suma “revelando-Se a Si mesmo, Deus quer tornar os homens capazes de Lhe responderem, de O conhecerem e de O amarem, muito para além de tudo o que seriam capazes por si próprios”3.

1 Cf. Dei Verdum, 6; Catecismo da Igreja Católica, 50
2 Dv,2. 
3 Catecismo da Igreja Católica, n.52


sexta-feira, 29 de abril de 2016

Revelação e Escrituras - Métodos de análise dos textos bíblicos



A Revelação Divina: palavras e fatos bíblicos1

A Bíblia é o livro que contém a Palavra de Deus expressa em palavras humanas. É uma grande obra literária; um livro único, inesgotável, onde se encontra tudo o que se refere a Deus e ao homem. É a obra mais editada, mais vendida, mais lida e mais estudada de quantas se escreveram. É, sem dúvida, o livro que mais contribuiu para configurar a cultura ocidental.

O termo “bíblia” procede do grero e significa etimologicamente “livros”. A Igreja grega usava este plural para designar a coleção completa das Escrituras Sagradas. Desde os começos do cristianismo, a Bíblia foi a base da vida espiritual, da pregação e dos ensinamentos da doutrina cristã.


A Bíblia: Antigo e Novo Testamento

A coleção dos 73 livros que formam a Sagrada Escritura tem duas partes bem diferenciadas chamadas “Antigos Testamento” (AT) e “Novo Testamento” (NT), que correspondem aos escritos antes ou depois da vinda de Cristo. A palavra testamento equivale aqui a praticamente “pacto” ou “aliança”.

O AT é composto de 46 livros2, que contêm tudo o que Javé-Deus revelava a seu povo para o conduzir a um reino de plenitude para alcançar uma felicidade duradoura3. Estes livros foram também aceitos pelos cristãos, porque neles descortinavam a preparação do grande acontecimento salvífico em Jesus Cristo. Os cristãos- à procura de nossas raízes – empenhamo-nos em nos familiarizarmos com a mesagem destes livros tão diversos, nos quais se recolhe a peregrinação do povo de Israel desde as suas origens até o aparecimento histórico de JC.

Chama-se NT ao conjunto dos 27 livros restantes, escritos de acordo com a “Nova Aliança” de Jesus Cristo, gravada não sobre tábuas de pedra, mas sobre corações de carne. Todos eles anunciam a “Boa Nova” proclamada por Jesus. Nós, os cristãos, temos a firme convicção de que tais livros contêm tudo que Deus nos quis ensinar  - através de Jesus – para nos livrar das ataduras do pacado e introduzir-nos nesse reino de graça, cuja meta final é a vida eternal, o céu para sempre.

A divisão atual da Bíblia em capítulos e versículos remonta ao século XVI, por Roberto Stephan, embora quem primeiro introduziu a divisão dos capítulos, nas cópias da versao Latina da Vulgata, fosse Stephan Langton por volta do ano 1214 e, mais tarde, Santes Pagnini dividiu cada capítulo em versículos na edição Latina da Bíblia feita em Lyon no ano de 15284.

O AT e o NT são duas partes de uma mesma História da Salvação, e embora nós, cristãos, pertençamos ao povo da “Nova Aliança”, não podemos ignorar o que diz respeito à “Antiga Aliança” que durante séculos preparará a humanidade para a chegada da “plenitude dos tempos”5. A Sagrada Escritura viveu durante muito tempo na tradição oral e só depois, as leis, as palavras dos Profetas, as sentenças dos Sábios, os cantos e os poemas dos Salmintas e as recordações históricas das intervenções salvíficas de Deus se puseram por escrito.

1. Todo este item é extraído do livro “Conhecer a Bíblia. Iniciação à Sagrada Escritura” de Josemaría Monforte, Ed Diel, 1998. Tit. Original: “Conocer la bíblia”, Rialp, 1997. Trad. de Luis Margarido Correa.
2. Cfr. Catecismo da Igreja Católica,120.
3. Os judeus, para se referir às Escrituras dizem tradicionalmente a Lei (Torá), os Profetas (Nebiim) e os Escritos (Ketubim), expressão que se torna clássica a partir do prólogo do livro do Eclesiástico. Também chamavam à Bíblia Miqrá, o livro da leitura ou Sagrada Escritura. Outro modo popular de se referir à Sagrada Escritura era Tanak, palavra formada pelas iniciais de Toráh, Nebiim e Ketubim.
4. Para uma exposição mais completa, cf. Gran Enciclopedia Rialp, verbete Bíblia I.
5. Gal4,4.

segunda-feira, 18 de abril de 2016

Introdução e Exegese do Antigo Testamento: Pentateuco e Livros Históricos



Apresentação

“Deus amantissímo, desejando e preparando com solicitude a salvação de todo o gênero humano, escolheu por especial providência um povo a quem confiar as suas promessas. Tendo estabelecido aliança com Abraão (cfr. Gen. 15,18) e com o povo de Israel por meio de Moisés (cfr. Ex. 24,8), revelou-se ao Povo escolhido como único Deus verdadeiro e vivo, em palavras e obras” (Dei Verbum, 14).

O objetivo deste grupo consiste em estudar os livros do Antigo Testamento que se ocupam de modo mais direto do agir de Deus com os homens ao longo da história do povo de Israel.

Teremos ocasião de sublinhar oportunamente a realidade da ação histórica de Deus e de mostrar como se analisam e estudam os textos bíblicos de acordo com os critérios hermenêuticos expostos na Introdução Geral à Sagrada Escritura.

Concretamente, os livros históricos, objetivo de estudo deste grupo serão analisados sob a pespectiva da crítica histórico-literária, sublinhando, à luz da fé, seu conteúdo salvífico. Sem esquecer sua dimensão histórico-literária, ter-se-á presente sua orientação para o Novo Testemento.

Procuraremos fomentar a preocupação por captar o sentido dos textos com a maxima exatidão e precisão, portanto, em seu contexto cultural e histórico e, ao mesmo tempo, manifestar sua inserção no processo total da revelação.

As explicações serão divididas em apartados dedicados ao Pentateuco, à chamada História Deuteronomista, à obra do Cronista e aos demais livros históricos da écopa persa e helenista. No estudo de cada livro, será útil começar por uma apresentação do status questiones da investigação acerca desses livros, ponderando criticamente as aportações e limitações que apresentam os estudos mais significativos.


Ao longo das publicações, serao analisadas passagens concretas destes livros históricos segundo os principais métodos e aproximações ao texto sagrado, prestando particular atenção às perspectivas teológicas e pastorais, em especial às que se descobrem quando o texto é lido à luz do Novo Testamento.