segunda-feira, 31 de março de 2014

Tobias, Judite, Ester - O livro de Tobias



Tobias, Judite, Ester

Os livros de Tobias, Judite e Ester pertencem a um gênero literário próprio: o midraxe ou a hagadá. Esta é uma maneira de propor a história que realça os aspectos edificantes e moralizantes da mesma, no intuito de promover a formação espiritual dos leitores. Distinguem-se dois períodos da literatura hagádica bíblica: 1) o período imediatamente posterior ao exílio (587-538 a.C) no qual os autores sagrados procuravam em termos tranqüilos a edificação dos fiéis (tal é o caso de Tb, Rt, Jn, Jó);  2) o período hasmoneu (sec. II – I a.C.), no qual a luta pela independência nacional alimentava antagonismo aos estrangeiros e rígido senso religioso ( Jd, Est e partes de Dn).

Os livros de Tobias, Judite e Ester têm notas comuns:

  - Referem episódios não concernentes a todo o povo israelita, mas apenas a uma determinada família (Tb), cidade (Jd) ou judeus residentes na Pérsia (Est);

    - As épocas da história universal a que aludem não podem ser identificadas com muita precisão;

    - O texto dos três livros passou por uma história obscura, o que suscitou questões de crítica do texto e canonicidade; Tb, Jd e Est 10, 4-16, 24 não constam no canon dos judeus da Palestina; são, por isso, chamados “deuterocanônicos”.

O Livro de Tobias

O texto original de Tobias era hebraico ou aramaico; e perdeu-se. São Jerônimo (+ 421) fez a tradução para o latim da Vulgata a partir de uma cópia aramaica. O livro de Tobias contem um núcleo histórico, ornamentado com objetivo didático e moral.

-  A historicidade do livro se depreende das indicações de reis assírios (Tb 1,1,16.21 s..), das referências geográficas (1,1.14,21; 3,7...), sociais e políticas (1,17; 2,3....), e jurídicas (5,3,14; 7,14).

-   O autor desenvolveu com certa liberdade os dados históricos de que dispunha, pois cedeu a anacronismos. Com efeito, a história de Tobias se desenvolveu sob Salmanasar e sucessores (se. VIII/VII a.C.), mas as idéias e práticas religiosas inculcadas pelo livro não se explicariam então, pois só foram adotadas pelos judeus após o exílio: assim, a entrega de dízimos aos prosélitos (1,8); e as exortações morais são da literatura sapiencial posterior ao exílio. Além disso, os capítulos 13 e 14 supõem Nínive em ruínas, Jerusalém destruída e os judeus no exílio babilônico, circunstâncias impossíveis na época de Tobias. Estes anacronismos insinuam que o autor, posterior ao exílio (250 -150 a.C), recorreu a uma história antiga, adaptando-a aos conceitos do seu tempo para que mais calasse no ânimo dos leitores.

-    A finalidade do livro é mostrar a admirável Providência de Deus para com um homem fiel posto em uma aflição e apresentar aos leitores um modelo de observância da Lei de Deus. Observem-se as numerosas exortações à piedade e à prática das boas obras: 1,16-19; 4, 5-19. O opúsculo de Tobias também é importante pela sua angeologia: o anjo Rafael aparece aí como guarda, curador (3,25; 8,3) e intercessor (3,16; 12, 12). As notícias referentes ao demônio Asmoneu são tiradas da tradição popular. 

quarta-feira, 19 de março de 2014

O Livro de Rute - Ensinamentos e à luz do Novo Testamento



Ensinamentos

A finalidade principal do autor não era narrar com detalhe uns fatos passados, mas ensinar que a manutenção da própria identidade religiosa e cultural não está em contradição com a abertura a outros povos e outras gentes. Em uma época em que se estava lavantando, no judaísmo pós-exílico de Jerusalém, um muro de separação entre judeus e gentios, chama a atenção a benevolência com que se trata um matrimônio misto entre Booz, um judeu, e Rute, uma estrangeira. Tampouco se censura a Majlón e a Quilón, os filhos de Elimélec, por terem se casado com mulheres do país de Moab. Desse modo, na Sagrada Escritura se vai insinuando que a salvação de Deus não se limita a seu povo eleito, e tem uma abertura universal:   dirige-se a todos os homens e mulheres de todas as raças e povos. Deus não rechaçou a uma estrangeira, mas contou com sua fidelidade para que formasse parte da linha genealógica do Messias.

Por sua vez, todo o livro é um testemunho do cuidado paternal de Deus para com os homens. Nele não se narra m intervenções divinas espetaculares, mas se observa como Deus está por trás da aparente normalidade dos acontecimentos, velando com sua providência. Depois do sofrimento pela morte de seus maridos, as duas mulheres chegam a Belém precisamente no tempo da colheita, e Rute tem a sorte de espigar no campo de um parente de Elimélec chamado Booz, justo quando este volta para Belém. Depois, quando Booz quer resolver as questões legais para assumir a responsabilidade sobre Rute, sobe á porta da cidade precisamente no momento em que passava por ali o parente com quem deveria falar. Como estes, há numerosos detalhes aparentemente intranscendentes que não mera coincidência,  pois permitem entrever que Deus vela por suas criaturas. Todas essas coisas acontecem guiadas delicadamente pela providência de Deus, de modo que parece que acontecem com a naturalidade das ações da vida ordinária.

A protagonista, Rute, atua com sensibilidade religiosa e oferece um modelo digno de imitação. Rute escolheu o Senhor como seu Deus e pôs toda a sua vida à sombra de suas asas (Rt 2.12), isto é, sob sua proteção. Por fidelidade a Ele, deixou sua terra e a casa de seus pais, e Deus abençoou com abundância SUS generosidade e fidelidade.

O Livro de Rute à luz do Novo Testamento

À luz do Novo Testamento se entende como o Senhor fez de Rute uma das grandes mulheres que protagonizam a história da salvação, da mesma maneira que ocorreu com Raquel, Lia ou Tamar. De seu neto nasceria o Rei Davi e por isso teve a honra de que seu nome aparecesse na linha direta da que haveria de nascer Jesus Cristo.

A tradição cristã viu em Rute  todos os homens e mulheres de todos os povos que, ao conhecer o Senhor, se incorporam à sua Igreja e encontram nela a sua casa.

Por outro lado, na leitura do livro de Rute encontram particular ressonância as palavras de São Paulo: “ Vossa vida está escondida com cristo em Deus” (Col 3,13). Deus está presente em todas as encruzilhadas do mundo e atua com discrição na vida ordinária: todos os detalhes da existência têm um relevo singular quando, perseverando na fidelidade ao Senhor, como Rute, se descobrem as marcas da sua atuação no dia a dia.
 
(Fonte:  Faculdade de Teologia da Universidade de Navarra)